sábado, 31 de março de 2012

Um Pobre Cavaleiro de Cristo


Ó meu Senhor, perdoa este pecador,
Perdoai pelas blasfémias, vícios e excessos.
Minha culpa é grande pai, pois te causei dor,
E ultimamente, minha vida tem sido um retrocesso.

Por caminhos obscuros andei, e por eles perdi minha fé.
Agora rumo de beco em beco, buscando o que tive em abudância.
Ultimamente pai, tenho sido mais incrédulo que Tomé!
Até gostaria de ter de volta minha ignorância.

No entanto, sigo como fiel cavaleiro.
Jamais esqueço o juramento que fiz à minha mãe;
Jurei escravidão, e o meu amor é verdadeiro.

Só te peço Senhor, ouça o meu clamor:
“Não por mim Senhor, não por mim,
mas em Teu nome toda a glória”

sexta-feira, 30 de março de 2012

Indestrutível

Sou uma máquina de guerra indestrutível. Treino e fé são as minhas armas
Mil cairão ao meu lado direito, e dez mil cairão ao meu lado esquerdo
Mas eu não serei ferido letalmente, mesmo que eu sofra algum arranhão.

Davi é meu patrono, Miguel é meu padroeiro, e o próprio Ungido é minha espada
Quem eu devo temer? Que escarneçam bastante de mim e do que penso
Estou de pé, vivo e solícito à paz e à boa vontade, ainda que para isso haja guerra

Aqui se faz, aqui se paga
Aqui não se faz, aqui se recebe
Aqui há regozijo, e aqui também se padece

A existência é dura, mas não quando se abraça o inabraçável
O decaimento do mundo é instantâneo, e obscurece a visão
Enquanto os sentidos ocultos trazem iluminação

E em honra d'O que me dá força direi: "Porquanto sem razão me armaram laços; para me perder, cavaram um fosso sem motivo. Venha sobre eles de improviso a ruína; apanhe-os a rede por eles mesmos preparada, caiam eles próprios na cova que abriram", porque eu sou uma máquina feita pelo Alto indestrutível.


quinta-feira, 29 de março de 2012

Meditações - 1


Contemplo tudo ao meu redor, e
Nada escapa ao meu olhar.
Bicho, gente, alimento,
Nada é tratado com diferença,
Em tudo considero a presença,
Desta força que move cada um de nós.

Busco a paz, busco o equilíbrio,
Perfeito entre mente e espírito,
E viajo.
Quando dou por mim, não estou mais aqui.
Vejo do alto, de fora, pessoas,
Vejo suas vidas, seus sofrimentos,
E percebendo que sou mais um, choro.

Tenho uma meta cada dia.
Planos de um suicida.
O desafio final é apenas sobreviver,
E quem ousa mais, certo é desfalecer.

Respiro um pouco, recupero o fôlego.
Percebo que hoje já vivi um pouco,
E que ainda estou muito longe do final.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Entropia da vida

A idade clama mais e mais por nossa vivacidade
Um dia a mais é como um metro diminuído entre nós e o caixão
Que pobre mortal já conseguiu fugir da derradeira fatalidade?
Que ser humano já escapou do buraco cavado no chão?

Só Aquele que morreu abraçando o mundo, mas esta foi uma feliz exceção
Regra dolorida rege o universo, traçando-nos o destino final
E a nós não cabe tristezas, nem façamos qualquer lamentação
Saibamos admirar a hora do fim, como nossa entrada num lar sem igual

Um cão vive quinze anos, e vive bem!
Corre, baba, dorme, come, e vai para o além
Quanto a nós, que diferença faz, trinta anos, cinquenta anos, ou cem?

Não importa quando a chamada para o além toca os nossos ouvidos
A Entropia da vida está ativa! Vivamos, responsáveis, os limites dos sentidos
Quando se morre bem, o tempo é apenas a agonia dos perdidos

terça-feira, 27 de março de 2012

Percepções



Estava viajando naquele ônibus,
Renato cantava em meus ouvidos,
Enquanto meu amor me entretia,
Povoando meu celular com putarias...

Olho para o lado e tomo um susto:
Não mais que um estranho é o que vejo.
Ali, do outro lado, olhando para mim!
Então, num lampejo, percebo: é o meu reflexo, que medo!

Contemplo aquele ser e ouço ele dizer:
"Sou a ponte, não tema"
Estou ficando louco? Que diabo me tenta?

O celular vibra em meu colo...
Ela requer minha atenção.
Tudo não passou de um devaneio, mera ilusão.  

segunda-feira, 26 de março de 2012

O novo Prometeu

Era uma vez um homem. Ele não tinha nome, porque não queria ser identificado pelos seus semelhantes. Dizia não ter pais, porque não queria ser rastreado, nem parentes, porque não queria que o estudassem a partir da observação dos seus co-sanguíneos. Ele gostava de liberdade. Gostava da transgressão. Gostava de tudo. Bom, de tudo, menos dos seus semelhantes, razão pela qual ele se escondia.

Seus iguais falam e julgam, e alguns dos seus iguais falam a verdade. Para ele não tinha conversa: A verdade e a mentira doíam de igual forma. Ele teve, então, uma idéia. Ele notou que sua sede de liberdade (e de libertinagem) advinha de um fogo. Um fogo ao qual quase todo mundo estava propenso. Ele desejava que este fogo controlasse tudo, ou seja, que ele pudesse fazer o que quisesse sem ser molestado por julgamentos, sejam eles justos ou injustos.

Este homem notava, também, que havia pessoas que não se sujeitavam a este fogo. Eram os maiores idiotas, segundo ele, porque não viviam a vida como ele. Ele se julgava o portador do fogo vivificante. Resolveu, então, queimar o mundo todo com o seu fogo. Tocava-o em tudo e em todos, e espalhava a sua desvairagem. Alguns se queimavam, outros não.

Até que um dia, uma grande chuva caiu sobre a terra, e todos aqueles que se deixavam queimar por aquele fogo ficaram desolados, pois aquele fogo já havia se extinguido, e com ele todo sentido da sua vida. Já não havia mais o fogo e aquele homem, que viveu parte de sua vida incendiando o mundo com as suas sandices, já não conseguia acender o fogo, pois o seu tempo já havia passado. Colocando toda a razão do seu ser naquele ígneo plasma, já não via mais razão de viver. Tentou, então, acabar com a sua própria vida, numa atitude egoísta e covarde, mas ao tentar fazê-lo, caiu do céu um raio, e quando percebeu, um ser o carregava pelo cabelo, levando-o para o alto de um monte.

Este ser o levava, segurando o homem pelos seus cabelos na mão direita. Na sua mão esquerda, trazia uma tocha que ardia com aquele mesmo fogo amado pelo homem. Chegando ao alto do monte, o ser amarrou aquele homem no monte, e quando terminou de amarrá-lo, ouviu do homem o seguinte:

-"Ei! Dá-me este fogo! Vivi minha vida devotado a este fogo, e quando o perdi, notei sofrimento que enfermo ou moribundo algum jamais sentiu. Tu, de aparência tão bela, não me negues esta piedade, que é tão bela quanto a tua forma!"

Aquele ser falou:

-"Pois eis que não te negarei. Mas não por piedade, e sim pelo designio que cumpro por ordens que me são muito superiores. Eu tocar-te-ei com este fogo iníquo, e tu, por algum tempo terás alívio. Mas logo cairá a chuva, e passarás anos em agonia. Passando este tempo, voltarei para tocar este fogo em ti, e um pouco mais de alívio sentirás. Logo, cairá a chuva e mais incômodo virá a morar em tua alma. De modo que, por séculos, ou talvez milênios, cumprirás esta pena. Entretanto, chegará a hora que nem mesmo o temporário fogo, que te queimará em intervalos, te fará mais feliz. Aí descobrirás que não cabia a ti incendiar o mundo com as tuas iniquidades, e chegará assim a tua pena final: a indiferença eterna ao teu estado. Nada te fará feliz, serás tomado pela tristeza e pelo ódio, e um dia, talvez um dia, me seja ordenado que eu te leve para junto de outros que, como tu, espalharam aquilo que não era para ser espalhado. Eles congregam nas trevas, e cada um passou pelo que vais passar, diferindo de ti apenas na forma específica que cada um usou para praticar coisas más na Terra. Toma o teu fogo, sacia-te enquanto ainda podes sentir a saciedade."

O homem então, falou:

-"Diz ao teu senhor, então, que não é preciso que ele mande a chuva. Minhas lágrimas hão de apagar o fogo."

Daquele momento em diante, tormenta sem fim caiu sobre o homem. O que acontecerá com ele depois dos ciclos quase infinitos de sofrimento? Bom, isto não sabemos. Mas disto, tiremos uma boa lição: Não amem o fogo que julgais conhecer bem. Pois ninguém conhece bem o fogo, a não ser aquele que queima eternamente nele, e não há outro destino para quem brinca com fogo, a não ser a queimadura cíclica, sem fim.

domingo, 25 de março de 2012

Nossa última morada

Mais literários que um sarau de poetas, mais silenciosos que a nave central de uma Igreja em pleno sábado de aleluia, mais cheios de mortos que quaisquer hospitais, são os cemitérios, locais sagrados onde nossos corpos um dia repousarão distantes das vicissitudes deste mundo.

Lindos epitáfios os enchem de valor literário e moral. Ainda que eventualmente um ou outro não correspondam à realidade, é um gesto lindo expressar através de uma, duas ou três frases, tudo aquilo que foi aquela pessoa que desceu ao túmulo. As palavras fazem parte da alma, e ao morrermos, podemos deixar uma verdadeira lição àqueles que ainda possuem algum tempo na face da terra.

O silêncio da nossa futura casa é também "sepulcral" (permitam-me a redundância). A não ser os nossos futuros visitantes (e eventualmente o coveiro, se for do gosto dele cantar enquanto trabalha), nossos corpos repousarão na mais absoluta paz e silêncio.

E, claro, nossos corpos "compartilharão" as presenças de muitos outros. Uma multidão de defuntos a descansar até que o destino final chegue a seus restos mortais (a ressureição para os crentes, a destruição cabal do fim do universo para ateus).

Isto é o cemitério, nossa última morada. Para quem está fora dele, parece um local macabro, mas não há como fugir. Aceitemos nossa realidade material finita e sejamos sempre bons enquanto pisarmos nesta terra, para que um belo e verdadeiro epitáfio decore dignamente a nossa tumba.

A Puta Maldita

      Após a sinuca, acompanhada do bom e velho blues, tive vontade de mijar. As ruas estavam cheias de vermes e delinquentes, eu precisava de um lugar tranquilo, calmo, escondido, e obscuro. Um tanto bêbado, desnorteado, sai cambaleando pelas ruas da praça de Itaboraí. Prostitutas se estapeavam e um viado gritava para chamar a atenção, e tudo isso passava zunindo pela minha cabeça como uma sinfonia tocada pelo próprio Satã. Que se foda toda essa merda, eu quero mijar. Cambaleei mais cem metros e achei um muro, com grades verdes...era o lugar perfeito. Abaixava o zíper quando vi uma mulher do outro lado da grade. Não levantei de volta. Ela me encarava, com seu rosto pálido, branco como glacê. Seus cabelos negros estavam desgrenhados, e pareciam sujos de terra. Ela estava com um vestido, bem colado ao corpo, e sua silhueta magra e esquelética me despertou interesse. Comecei a ter uma eração. Ela baixou o olhar e ao ver meu membro rijo, ereto, lambeu os lábios com sua língua seca e se aproximou. Eu estava em transe, imobilizado, e não esbocei reação. Ela se aproximou mais, e pude sentir o fedor que dela emanava. Vi que em sua cabeça haviam pequenas crateras onde se amontoavam vermes de toda sorte. Ela se abaixou e começou a me chupar. Extasiei. Eu viajava na puta que pariu quando comecei a perceber uma leve dor, juntamente ao prazer. Abri os olhos e olhei para baixo: ela mastigava meu pênis. O sangue escorria pela sua boca, e ela devorava com voracidade. Refestelada, ela me olhou com um ar grato, levantou-se e voltou para o breu, para o quinto dos infernos de onde havia saído, para o colo do capeta. E eu fiquei ali, a observar meu membro dilacerado, gotejando sangue.

sábado, 24 de março de 2012

Uma vida, duas vidas...

Eu poderia me suicidar,
Que de nada iria adiantar.
Estou vivendo vidas!
Que falta uma fará?

Sinto uma explosão incrível de energia,
Que irradia meu corpo...
Tornando minha vida, outrora tediosa,
Num quadro completamente louco!

O que há para mim na esquina?
Que criatura habita por lá?
Que ela me possua. Pudor aqui não há.

O novo me saúda dia-a-dia,
E eu correspondo com alegria!
Que esse trem da vida não pare, Oxalá!

sexta-feira, 23 de março de 2012

O x da questão

Era zero hora quando eu fechei os olhos e contactei o Incontigente
Antes eu queria a paz, mas ela fugia de mim como a mulher foge da serpente
Fazia-me, outrora, auto-suficiente, soberbo e pretenso ser independente


Desprendi-me da natureza humana, socraticamente buscando conhecer
A natureza inglória do homem, a incontestável miséria do ser
E então, a partir daí, para além dos meus visíveis limites transcender 

Descobri, na linguagem axiomática do universo, aquele código bom
Não ideal, mas aproximado do que preciso para encontrar a luz
E por fim, toda perfeição do Universo, perfeita canção, a reuni num tom
Que em Uníssono ao etéreo minha alma conduz

Ah, perfeita metafísica encontrei, ao desvendar o x da questão
Qual boa ascese ou abnegação, em doses homeopáticas ou em profusão
Não será capaz de guiar almas perdidas, desencontradas ou em confusão
Até o objetivo que, no meio de bárions e léptons, os homens buscam em vão?

quinta-feira, 22 de março de 2012

Viva uma vida


"Luz ou escuridão?", tu me perguntavas
À meia luz, eu retrucava,
Então nos entregamos ao nosso obscuro prazer.

Você, com suas mãos habilidosas, me amarrava com presteza,
Mas, ao mesmo tempo, piedosa,
Não empregava muita firmeza.

A noite nos deixou à sós,
E o tempo seguiu atroz.
Então nos demos conta:
Nada havia entre nós.

Te imobilizei com meus braços,
E te finalizei com meus beijos.
Tu, rendida, me despertava desejos,
Que seriam saciados, com voracidade animal.

Já quando raiava o dia,
Tu me olhavas, e eu dormia.
Tu sussurravas, "Viva uma vida",
Em sonhos, "Welcome", era o que eu ouvia.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Meu povo sofre...


Meu povo sofre por falta de conhecimento
Eles doam tudo de si, inclusive a própria alma
Para aqueles que vêm em meu nome pedir bens materiais

Meu povo sofre deitado em seu próprio excremento
Pois não sobrou lugar digno para descansar com calma
Eles vão atrás do milagre fácil ao invés dos dons espirituais

Meu povo sofre, afogado em seu próprio lamento
Porque escolheram fugir da dor, e não abraçar a cruz
Eles buscam comprar um milagre, e não aumentar a sua fé

Meu povo sofre, e nada se pode fazer para abreviar seu tormento
Ele doa seu soldo e fica sem água, sem comida, sem luz
Já não há ônibus, ou carroças: rastejam todos, ou andam a pé

Meu povo sofre pela própria ignorância e pela malícia dos ímpios. 
Minha mão cairá pesada sobre todos eles...

terça-feira, 20 de março de 2012

Nova mensagem de voz


Deixe sua mensagem após o sinal...

Sinto sua falta.
Jamais pensei que seria assim.
Perdi a noção do tempo, perdi minha sanidade...
Parece que foi ontem.

Não ignoro a realidade,
Sei que devido aos fatos,
Você jamais ouvirá este recado.

Eu estava com raiva.
Você gritava ao meu lado, me culpava, e
O carro bateu.
Não vi mais nada.

Só acordei uma semana depois,
No hospital.
Depois me disseram que,
Para você tinha sido fatal.

Foram 8 anos meu amor, e
Agora, estou aqui...
A mesma curva perigosa,
Um pouco à frente.

Desta vez nem vou tentar freiar,
Vou de encontro à ribanceira.

Estou indo amor, estou chegando...

segunda-feira, 19 de março de 2012

Princesinha moldava

Menina dos cabelos castanhos escuros, dos olhos de mel
Que baila cantando naquela língua doce que, acima do Danúbio, ressoa
Do latim filha, como o sangue que alveja tua pele, branca como papel
Bailando, segurando teu vestido vermelho, de todas as outras destoa

Européia dama dos seios fartos, do sorriso fácil, da doçura infinda
Como não lembrar de quando beijei teus lábios saborosos?
Tua face, mais rosada de vergonha que do frio com que Deus a nós brinda
A tua imagem traz-me à noite sonhos vigorosos!

De onde poderei tirar mais inspiração para meus versos
Que de teu ser, que torna este o mais belo de todos os universos
Que da tua imagem, que torna em um todos os meus pensamentos dispersos?

A quem darei o meu amor, tão renegado
Se não a ti, que logrou de mim amor de um jeito tão simplificado
Tendo esquecido nossos erros, que fizeram-me ficar de ti separado?

domingo, 18 de março de 2012

Diário de um Suicida - dia 47

8:00

Que dia lindo faz hoje. Estou aqui na orla, como de praxe, mas não tenho mais motivos para chorar. Compreendi todas as mazelas, toda tristeza, dor e arrependimento. Nossa, foi tudo tão simples. Agora entendo tudo, e aceito. Estou pronto, pronto para me despedir de tudo. Antes gostaria de deixar registrado para aqueles que lerem este diário que a resposta está dentro de nós mesmos. Não existem guias, psicólogos ou milagres; feche os olhos, respire fundo, esvazie sua mente e relaxe. Medite, busque lá no fundo, e tu irás encontrar tua resposta. Quando dei por mim e encontrei minha resposta, nossa! Tudo tão belo! Descobri que sou o mais perfeito dos seres. E preciso evoluir. Minha felicidade não está neste mundo. Estou pronto para transcender.

14:00

Almocei, tomei banho, enviei para minha mãe uma carta com todas minhas senhas e movimentações bancárias e li pela última vez Hermann Hesse. Escolhi Knulp, pois sempre tive muito carinho pelo protagonista. Estou pronto. Liberei o gás e fechei todas as portas e janelas. Vou apenas deitar e dormir, e quando acordar, todavia.

A quem presentear?

Estava eu caminhando pelas ruas, quando uma bolsa estranha cai do céu exatamente na minha frente. Saía uma fumaça dela, fina e suave, e dela irradiava calor. Bom, era de se esperar, uma vez que ela veio do céu e com certeza experimentou o atrito com a atmosfera. De repente, ela abriu-se sozinha, como se a gravidade tivesse feito a bolsa, que mal estava aberta, abrir-se ainda mais após estar um tempo na iminência de se abrir.

E qual foi o meu espanto ao ver o que tinha dentro! Era dinheiro! Muito dinheiro! Indaguei-me que tipo de astronauta louco lançaria de sua espaçonave tantos dólares. Mas agora era meu todo aquele tesouro, e na solidão eu conservaria este tão valioso segredo.

Gastá-lo? As notas estavam todas em ordem de número de série, e isto me causaria problemas com a justiça. Guardá-lo no banco? Causaria o mesmo problema. A quem doar, a quem presentear com esta dádiva, já que eu não posso gastá-la comigo?

Vi uma linda moça, saindo de uma ambulância numa maca, e nela entrando num hospital. E vi que um homem fora até o saguão do hospital pagar por sua internação e tratamento. Eu invejei aquele homem. Como eu gostaria de dar tudo o que tinha para o bem de quem eu amo. Mas os malditos números de série do meu dinheiro não me permitem. O que tenho são milhares de dólares inúteis...

sábado, 17 de março de 2012

Castigo com Disciplina



Privado do sentido da visão,
Amarrado por cordas, firmemente.
Sinto o peso de sua mão,
Que me castiga cruelmente.

Tu manipulas alguns mecanismos,
E sinto meu corpo contorcer.
Você gargalha, e fala com cinismo:
Não quero te ouvir gemer!

Me amordaça, mas antes me beija!
Penso em versos íntimos e clamo: Não me apedreja!
E em seguida, sem piedade, me chicoteia.

Mas depois, lambe minhas feridas como animal,
Me diz: "Mereceu o castigo, pois agiu mal".
E faz amor comigo, um orgasmo surreal.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Trezentos e sessenta graus

Eu não te avisei? Diga-me diante de minha cara que eu não te avisei...
Ah, é verdade, eu não te avisei. Mas, eu precisava?
Os teus atos, tuas palavras, foram destruidores do sonho que eu sonhei
E Hipnos em pessoa clamou pela restituição que eu necessitava

E a restituição veio. Eu não era pobre? Eu não era um desempregado?
Não era eu quem não tinha um carro, ou um apartamento?
Olha ao meu redor! Deus dignou-se em remover o meu fardo
Deu-me tudo o que eu merecia, extinguiu meu lamento

E agora ele dá-te lamentações, enquanto eu sacio meu espírito sofrido
Nego-te a gota de saliva refrescante, como fez Lázaro e o pai Abraão
Não te enganes! Não desejo teu sofrer, não desejo ver teu ser decaído
Mas a pena pelas tuas palavras afiadas independe do querer de minha mão

Esteja bem, ma cherie, quem sabe eu não me compadeça
Eu não te odeio, e espero um dia, talvez exercer a santa misericórdia
O que passou, passou: regenere-se, ou padeça!
Na riqueza ou na pobreza, busque sempre a concórdia, jamais a discórdia

quinta-feira, 15 de março de 2012

Inverdades



Quem nunca mentiu?
Quem nunca omitiu a verdade?
Quem nunca traiu, mas
Ao ser traído, faltou com a piedade?

Em minha carne está o egoísmo,
E na sua também, meu bem!
Seguimos o ciclo da vida,
Concedendo perdão a ninguém.

Vamos parar de joguinhos,
Esqueça o passado, este cálice amargo.
Vamos brindar ao prazer!

Não negue seu amigo amado,
Entregue-se sem tempo nublado.
De agora em diante seremos só eu e você.

terça-feira, 13 de março de 2012

Antítese

Tudo no mundo é uma antítese, e as antíteses são tão deliciosas...

A saciedade é a antítese da fome, e que saciedade tão deliciosa! O descanso é a antítese do trabalho, e quão maravilhoso o descanso nos parece quando dele disfrutamos! O bem é a antítese do mal, e praticar o bem, ser o bem, é uma virtude que enche a alma de regozijo!

A noite é a antítese do dia, e muitas das antíteses, as mais deliciosas, vêm na noite. Mas antíteses são vias de mão dupla, e a delícia que nos embriaga de felicidade, pode ser a delícia que entope nossas artéias e nos leva à morte. Sim, toda a antítese é uma delícia, mas nem toda a antítese nos convém. O sexo é a antítese da castidade, e é delicioso, porém a escravidão do sexo é o mais ordinário e prejudicial dos vícios: já levou milhares à ruina, nestes tempos atuais e em outros tempos do passado.

O ódio é a antítese do amor, mas por mais que, por um instante, o ódio pareça preencher nosso espírito com conforto e esperança de vingança, ele corrói e destrói a alma. A envenena, como diria um grande sábio...

Saber escolher a direção correta da antítese é o caminho que nos leva à verdadeira e sã loucura. Correr por todas as direções sem saber que via tomar é abraçar a insanidade deste mundo, que nada tem a ver com a sã loucura, e que nos leva à ruína. Nossos caminhos apontam na direção correta em que buscamos nossas antíteses.

Diário de um Suicida - dia 39


13:49

Algum tempo atrás tive um momento de fraqueza. Liguei para o trabalho de minha ex namorada. Minha intenção não era pedir que ela voltasse para mim, pois sei que ela está com outro, e está feliz. Minha intenção era mais uma vez pedir perdão. Ela ainda tem ressentimento de tudo que fiz. O que mais me dói é que ela superestima meus erros e subestima meus acertos. A história se repete com minha antiga amiga. Cometi meus erros, me arrependi e tive a hombridade de ser sincero e me confessar. Agora pago pelos meus pecados com a solidão. Ela me ouviu, mas ainda tem muito rancor. Disse para eu nunca mais ligar, que ela tentou bloquear o celular para não receber ligações minhas, mas que isso só podia ser feito com mandato judicial. Eu disse a ela que a pouparia deste trabalho, e finalmente dei o meu último adeus. Como é estranha a vida. Como pode num dia uma pessoa ter orgasmos contigo e no outro ela não desejar te ver nem pintado de ouro? Novamente fui para meu recanto, a orla. E chorei.


22:37

Sinto minha vida conturbada. Todos os meus antigos amores estão bem e felizes, e o palhaço está só. Eu sempre fui tão solitário, um lobo da estepe,  e agora uma presença em minha vida é algo tão vital! Será isso um castigo dos céus por todas traições que cometi? Em verdade eu trai alguém? Os céus me castigam, e eu não irei fraquejar! Sorverei deste cálice amargo até o fim, seja lá qual for.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Até onde a loucura me levar

Tenho andado pelas ruas da cidade, a procura do sorriso perfeito. O problema é que eu tenho procurado o sorriso perfeito na face de outras pessoas, quando o que eu deveria realmente procurar era um espelho, e um pouco de boa vontade, mas agora parece-me que devo mudar o meu objetivo...

Devo buscar aquilo que eu sempre vejo pela janela, mas nunca perto de mim. Devo buscar a excelência do corpo e da alma, devo buscar a excelência no trabalho e na aprendizagem, a excelência no amor e na paz, a excelência em ser humano. E isto não se encontra nos outros, mas em si mesmo.

Devo, assim, ser ainda mais louco. A sociedade transformou-se de tal maneira, que eu converti-me e converto-me, cada vez mais, num alienígena, num estranho, estranhamente desviado das novas "virtudes" corrompidas. Pois louco sou, e louco não quero deixar de ser. Se na loucura encontro paz de espírito e elevação da alma e dignificação do corpo, quero ser cada vez mais doido.

Não estou sozinho. Há um exército de loucos, escondidos detrás dos mais variados rótulos. Unidade na diversidade. É importantíssimo afirmarmos nossa loucura e batermos de frente contra os "normais" que insistem em marginalizar os virtuosos em nome do caos relativista. E eu irei, até onde a minha loucura me levar...

domingo, 11 de março de 2012

Sombras, névoas e silhuetas

Por entre névoas vejo a tua silhueta, tão envolvente
Não nitidamente, mas suficiente para fazer meu sangue ferver
Tento dissipar a neblina com as mãos e ver-te claramente
Com sorte, tocar tua pele macia, assim arrepiando-a de prazer

Não sei se amaldiçôo a cegueira do momento, ou se a bendigo
Se por um lado meus olhos não te vêem, meu coração te sente
Amo-te, dama incógnita, ingênuo como um menino e miserável como um mendigo
Apenas a fé mantém-me ligado a ti, à tua imagem desfocada aparente

O que será isto? Enxofre, dióxido de carbono, água em vapor?
Esta nuvem densa que me impede de alcançar-te a ti, e à tua visão
Não! Não são elementos, nem ectoplasmas, nem produto do calor!
Parece algo mais forte, que subjuga a física e a metafísica ao coração

Descobri teu nome, névoa densa e traidora, matadora de desejos,
Enquanto via os contornos daquela Eva desnuda, que uma maçã comia!
E ali, naquele instante, descobri aquilo que me arrepiou os cabelos
Era o destino, capataz implacável que me torturava enquanto minha razão dormia!


Diário de um Suicida - dia 30


10:00

Faz alguns dias que não escrevo aqui. Os dias tem sido agitados. No sábado meu avô faleceu. Quando o telefone tocou e vi a reação de minha cunhada eu já compreendi. Terem vindo me falar depois foi apenas uma confirmação desnecessária. Não sei explicar, mas a última lembrança que tenho de meu avô foi numa manhã no hospital, ele estava na varanda e eu ao seu lado quando veio o médico conversar com ele. Ele disse ao médico que estava agoniado por ter de esperar a operação e não ter previsão de alta, e que sentia falta de minha vó, se preocupava por ela estar só. Ele então chorou. Nunca havia visto meu avô chorar, e aquela cena me comoveu sobremaneira que sempre que me lembro e como se estivesse vivendo aquilo novamente.
No domingo foi o enterro. Se não me falha a memória é a primeira pessoa realmente próxima de mim que morre. Chorei bastante. Tanto me fez chorar a dor da perda quanto a dor de ver meu pai destruído pela tristeza. Jamais havia o visto assim. Espero que o tempo faça seu trabalho e leve embora a tristeza. Espero que minha vó resista à perda de seu companheiro de vida. Foram cerca de 60 anos juntos.


23:32

Hoje pela tarde fui na orla ver o mar. Por muitos vezes lá estive acompanhado de uma amiga, e me doeu perceber que desta vez eu estava só. Todos precisamos viver nossas vidas e seguir nossos caminhos, e por vezes os caminhos percorridos nos afastam de algumas pessoas. O caminho que agora trilho me afasta de todos. Sou o lobo da estepe. A solidão para mim não é uma opção, mas sim uma necessidade. Enquanto estive ali sozinho observando a cidade do Rio do outro lado da baía, tive um sentimento nostálgico, uma sensação de vazio e uma saudade de tudo aquilo que vivi, tudo que deixei para trás por egoísmo ou por vaidade. Ouvi o lobo dentro de mim uivar e tive medo. Olhei para as pedras e por uns instantes pensei em pular. Minha vida está obscura, a névoa cai e não enxergo um palmo à minha frente. Este quarto solitário é como uma cela, aqui é minha fortaleza da solidão. Só me resta dormir, e aguardar com paciência o que o destino me reserva. 

sábado, 10 de março de 2012

Diário de um Suicida - dia 23


9:00

Passei a noite com meu avô. Ontem ele estava bem, mas hoje pela manhã estava meio aéreo, meio distante. Tive um mau pressentimento que me deixou muito triste. Espero que seja algo passageiro, efeito de algum novo medicamento. Seus membros estão inchados e ontem tiveram que furar seu pescoço para colocar o soro. Tive pena. Após tentarem furar diversas vezes as veias do braço que partiram para o pescoço. Eu vi tudo, e senti em mim a dor ao ver seu rosto contorcer-se ao ter o pescoço furado por diversas vezes. Esta noite consegui dormir, mas estou um pouco quebrado. Saí mais cedo do hospital pois vou encontrar uma amiga. Ela fará um exame em Madureira e pedi para ir junto, para poder revê-la. Nossa história não é longa, mas já teve seu esplendor. Isso me lembra uma fala do curta "Faubourg Saint-Denis": "Nossa primavera foi... foi maravilhosa, mas o verão acabou agora e deixamos passar o outono. E agora, de repente, está frio, tão frio que tudo está... tudo está congelando. Nosso amor adormeceu e a neve pegou-o de surpresa. Mas se você adormece na neve, você não sente a morte chegando". Nossa morte chegou cedo demais, e agora nosso amor está morto.

20:00

O dia foi cansativo e triste. Cheguei tarde e só consegui dormir. O encontro com minha amiga não foi nada bom. Talvez tivesse sido melhor não ter ido. Creio que seja hora de se despedir do passado e abrir as portas para o novo. Mas não é tão simples assim se desprender de tudo. Preciso aceitar as coisas, e seguir dizendo meu novo mantra, "Welcome".

sexta-feira, 9 de março de 2012

Mar

Se em algum momento me fosse concedido sair do corpo e pairar em algum lugar
Escolheria pairar sobre as águas do oceano, onde a paz reina no trono da harmonia
E se minh´alma ainda conservasse os sentidos do corpo, maior ainda seria meu bem-estar
Ao sentir a brisa que corre logo acima das águas, vem-me a graça e a epifania

Nada há mais bonito que os lençóis d´água quebrando-se mutuamente no oceano
Diante da sua majestade do mar, ou "marjestade", como gosto de dizer
Nada pode existir se for insano
Tudo é vida, tudo é prazer

E se eu pudesse assim pairar
Sobre os lençóis de água, sobre as formas do mar
Não sei se, ao meu corpo sonolento gostaria de retornar
Mas possivelmente gostaria de, eternamente, ao oceano me misturar

quinta-feira, 8 de março de 2012

Diário de um Suicida - dia 2


10:00

Que calor. Estou indo para a Penha ficar com meu avô. Ele está internado, com câncer na próstata, mas seu estado de saúde é bom. Creio que será bom, pois poderei passar um tempo com ele que nunca tive a oportunidade de fazer. Desde que eu e meus pais nos mudamos que meu contato com minha família paterna tem sido escasso. Em verdade, faz um tempo que todo meu contato com o mundo tem sido escasso. O lobo tem assumido o controle mais que o homem, e sua aversão pela socialização é perturbadora. Por vezes me pergunto se é o lobo que vive em mim ou se sou eu que vivo nele. Enfim, chega de divagações, ainda tenho mais uma hora de viagem, vou tirar um cochilo.

22:00

O dia foi de extremo calor no hospital, mas agora de noite já está mais ameno. Conversei bastante com meu avô e estou satisfeito. Ele está muito bem, acredito que em breve sairá daqui. Já me acostumei com a rotina hospitalar, mas não sei se conseguirei dormir aqui. Atrás do hospital passa o trem, e sempre que ouço ele passar tenho algumas lembranças. Não trouxe nada para passar o tempo, e por isso passei todo momento solitário a pensar. Pensar demais é por vezes doloroso, e assim o foi hoje. Tive muitas lembranças e divagações. Tracei planos e articulei estratégias, para logo depois com um sopro lançar tudo ao vento. Saudades, muitas saudades. Isso não está me fazendo bem, é melhor tentar dormir.

terça-feira, 6 de março de 2012

Diário de um Suicida - dia 1

11:43

Mal posso escrever no sacolejo do ônibus. Obras intermináveis na estrada e sempre os mesmos buracos. Estou num misto de felicidade e tristeza. Abandono a casa paterna para morar num pequeno quarto em Niterói, próximo de minha faculdade. Será uma experiência incrível, tenho certeza, mas de certa forma já sinto uma nostalgia que me faz pensar se tomo uma atitude correta. Enfim, sem lamentações, sem olhar para trás. Que venha o novo: Welcome!

14:35

Finalmente estou aqui, devidamente instalado. Não trouxe muito, pois o quarto já era mobiliado e não pretendo cozinhar aqui. O único trabalho que tive foi o de guardar roupas no armário e alguns objetos de higiene pessoal. Estou experimentando uma paz temperada por melancolia, e gosto disso. Ainda no ônibus recebi, depois de quase um mês, uma mensagem de minha ex. Perguntava como eu estava. Menti. Disse que estava muito feliz e de mudança. Não compreendo seu interesse, me intriga um pouco. Enfim, não quero pensar muito nisso. Vou sair e dar uma caminhada na praia. É o melhor.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Cicuta Socrática

Humanos, ó Humanos!

Que luta implacável tendes com teu inexorável destino! Que insana sina que tendes quando vos passa pela cabeça a idéia da imortalidade material! Não vês que és pó, e ao pó has de retornar?

Humanos... Por qual motivo vosso olhar permanece na superfície, ao invés de ir até as profundezas do ser? Não vês que sois sangue, sois coração, sois fígado, sois pulmões, sois rins, sois ossos, sois cérebro? Acaso crês que estes órgãos são de aço indestrutível?

Ó, humanos... Do mais saudável dos homens, ao mais moribundo deles, ninguém está a salvo. Nossa transgressão nos trouxe a fragilidade e a vulnerabilidade à enfermidades, aos acontecimentos tristes e fortuitos, aos acidentes, à violência... A cicuta socrática está permeada no ar, e num único instante independente da nossa vontade, ela invade a nossa boca, o nosso estômago, o nosso corpo, e aí pronto! Está feito e consumado o final da nossa existência material.

Sócrates, aquele que provou de bom grado a cicuta socrática, ensinou-nos que a nossa derradeira pena já está em curso. Ela não pertence à velhice, pertence à vida. Ensinou-nos também a solene lição: "Conhece-te a ti mesmo, e conhecerás a Deus".

Dolorosa Lembrança


Madrugada,
Barulhos na janela. É você?


Suas mãos me apertando,
Pedaços de minha pele em suas unhas,
E meus lábios sangrando.


Eu ajoelho, beijo seus pés e imploro:
Clemência!
Tu me maltratas ainda mais.


O vento zumbe, intenso,
Enquanto meu sangue ferve.